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  • Writer's pictureAna Paula Maciel Vilela

A Travessia dos Porcos e a Felicidade






O som dos pneus no asfalto molhado era uma advertência para ser cuidadosa após a chuva incessante da noite. No início da manhã ainda chuviscava quando me dirigia ao centro pastoral onde ofereço aulas de exercícios terapêuticos chineses.

Em uma esquina, uma cena inusitada: três porcos atravessam a rua, devagar e em fila. Resido em uma capital e não é comum ver porcos na rua . A cena, deliciosa, me fez parar para a família e para observar como a cena me tocou, o que causou em mim para alegrar a manhã nublada e chuvosa.

Do outro lado da rua, em sentido contrário, outro carro também aguardava e a motorista se divertia com a cena.

Foi rápido mas cheia de significados para mim. O efeito das coisas aparentemente sem importância que se tornam significativas e que trazem tanta reflexão. Em poucos segundos viajei para a infância, para a fazenda onde passava finais de semana e gostava de alimentar os porcos do chiqueiro com mangas e goiabas.

Meu dia foi preenchido com uma certa leveza e consegui transmitir essa sensação para minhas alunas, a aula foi igualmente alegre.

Tenho na sacada do meu quarto uma casinha de madeira, para passarinhos. Certa vez uma espécie, bem pequena, se aproximou, entrou e fez uma vistoria mas algo a fez mudar de ideia. Não permaneceu. Nesta manhã um pássaro bem maior pousou em seu telhado. Foi outra alegria.

Enquanto digito esse texto, uma rolinha entrou no quarto do meu filho que é voltado para o quintal. Elas fazem ninho na amoreira, no quiosque e já estão tão íntimas que gostam de beber água na vasilha do cachorro aproveitando suas sonecas. Outra alegria.

Assim, resolvi colecionar esses momentos, registrar aquilo que me faz bem e provoca em mim contentamento, modificam meu humor e me faz esquecer aquelas tristezas que habitam nosso ser, na profundidade. Segundo li em um texto da poeta e romancista palestina Heba Abu Nada, morta na faixa de Gaza em outubro de 2023, "a tristeza não é esquecida, não morre nem se torna obsoleta, mas se transforma em outras formas mais adaptáveis à vida...".

Que possamos colecionar esses fragmentos de alegria, são eles que deixam nossa caminhada mais feliz.


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